sexta-feira, 1 de julho de 2011

O paradoxo da música acessível

Rock, jazz, mpb, samba, blues, rumba, reggae, bolero, tango, raga, trance, baião, rap...

Os gêneros e subgêneros musicais são inúmeros. Particularmente, acho perigoso reduzir música a isto. Muitas vezes os critérios são duvidosos, segmentam e estimulam meramente o consumo. Sob o aval da indústria cultural, o rótulo estereotipa e estigmatiza, funcionando como uma ferramenta perfeita de mercado, ditando regras de comportamento.

Mas não nego que se usado de forma criteriosa, contextualizando-se as idéias, nomear gêneros funciona para sintetizar os vários aspectos estéticos de uma obra musical.

Há aproximadamente 5 anos tomei conhecimento de uma corrente musical que valoriza a abordagem musical de qualquer indivíduo, independente de sua habilidade técnica e de seu conhecimento teórico. Um gênero musical em que não há pré-requisitos para sua execução. A parte intrigante da estória, é que justamente essa estética musical dificilmente pode ser reduzida a um simples rótulo. Talvez o mais difundido seja improvisação livre, mas isso não significa que seja aceito com unanimidade.

No universo da improvisação livre, o que vale é a auto gestão e o respeito. Não há espaço para egocentrismo e vaidade. Pode parecer utopia, mas é dentro dessas “regras” que ela se baseia. Justamente por isso que talvez esse estilo musical não seja tão difundido: não por um complô baseado em teorias da conspiração, mas por um percurso “natural” da história. Afinal, vivemos submetidos ao capitalismo selvagem, que nos obriga a sermos destaques, aceitos, bem-sucedidos, campeões... mesmo que isto implique em abrirmos mão de nossa felicidade.

Não é raro o caso de músicos angustiados, frustrados, por buscarem na música somente o que a indústria cultural sugere. Eles têm como referência apenas aquilo que ela formatou como um gênero definido fácil de reconhecer, mas que ao mesmo tempo só conseguem resultados práticos satisfatórios alguns indivíduos “abençoados”. A apreciação desses formatos é acessível, já a prática encontra obstáculos de “aprovação” nos mais variados setores: acadêmicos, comerciais, técnicos etc. Enquanto isso, às margens desta conjuntura, está a improvisação livre, que tem uma ótica contrária: a prática não necessita de “aprovação”, mas a difusão infelizmente é restrita.

A difusão da improvisação livre resultaria na acessibilidade da prática musical de todos os indivíduos. As pessoas não abandonariam uma pretensa carreira musical por “falta de capacidade”, pois uma nova relação com a música estaria implantada.

Numa primeira audição de improvisação livre você pode até dizer: “ah... isso não é música, qualquer um pode fazer isso!” Até certo ponto você está certo. Mas pode ter certeza que uma música autêntica e verdadeira está presente ali. Basta abrir os ouvidos e a mente para os sons e o silêncio.

Antônio Panda Gianfratti- um dos nomes mais importantes da improvisação livre brasileira


4 comentários:

Ana Mesquita disse...

Demais o texto Galvão. Mudança de paradigma sempre é contraditório mesmo, causa estranheza o novo e as pessoas estão acostumadas a um modo fazer as coisas, seja por costume, seja por tradição acadêmico teórica, e se esquecem que outras formas podem surgir da capacidade humana de mudar e criar.
O problema sim é a difusão. Nas aulas do Calado lá no curso de jazz ele colocou que o free jazz não fez tanto sucesso como outros estilos de jazz por conta de não ser "agradável" aos ouvidos. Ou seja, as massas queriam música para dançar e se divertir. Para mudar esse quadro, nada como a prática da audição criteriosa e a capacidade dos "ouvidos abertos".

Namaguideras disse...

Valeu a observação a Ana!
Mas devemos lembrar que improvisação livre e free jazz (por mais que "flertem" e tenham pontos em comum entre elas) são linguagens distintas.
Abs.

. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Nay de Deus disse...

Namaguiderás. Nós te amamos! <3