sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Ornette Coleman: o músico que libertou o jazz


No final dos anos 50, o jazz havia atingido um nível elevado no mundo das artes. Ele se tornara um gênero musical sofisticado, para ouvidos apurados e dispostos a contemplação.

Mas o desenvolvimento estético do jazz, por mais que tivesse gerado gêneros com nuances diversas de abordagem (a suavidade e a introspecção do cool jazz em contraponto com o calor e a explosão do hard bop, por exemplo), ainda se mantinha “preso” a revolução promovida pelo be bop de Charlie Parker. Mas eis que surge neste cenário um homem que sacudiu as bases do jazz praticado até então: Ornette Coleman.

Desconstrução era a palavra de ordem do saxofone alto do músico e compositor. Melodia, harmonia e ritmo agora tinham autonomia para habitar e interagir dentro de condições “proibidas” dentro da seara do jazz. Ornette Coleman colocou suas idéias pessoais a frente de qualquer condição imposta. Tocou com saxofone de plástico e com instrumentos em que não tinha muita intimidade (sax tenor, trompete e violino), sempre buscando imprimir novas cores a seu conceito.

Sua música densa, anárquica, atonal, aleatória (dentre tantos outros atributos que podemos concedê-la), causou repulsa entre grande parte da crítica, do público e da classe musical. Mas também foi celebrada por aqueles que viam ali um novo rumo, uma atitude autêntica e radical.
Seus primeiros álbuns, com belas capas e títulos sugestivos (“Something Else!!!!”, “Tomorrow Is The Question!”, “The Shape Of Jazz To Come”, “Change Of The Century”, “This Is Our Music”), complementavam perfeitamente sua música instigante.

Em 1960, Ornette Coleman lança a sua obra mais reverenciada e polêmica: “Free Jazz- A Collective Improvisation By The Ornette Coleman Double Quartet”. O que se ouve (neste que é considerado um álbum manifesto) é de um lado o quarteto habitual do músico, com o próprio no sax alto, Don Cherry no trompete, Charlie Haden no contrabaixo e Ed Blackwell na bateria. Do outro lado temos Eric Dolphy no clarone, Freddie Hubbard no trompete, Scott LaFaro no contrabaixo e Billy Higgins na bateria. Dois quartetos tocando simultaneamente de forma livre e intuitiva o tema “Free Jazz”, de 37 minutos. No lado b, uma variação do mesmo tema chamada “First Take”, de 17 minutos. O disco foi produzido de forma que cada quarteto toque num canal individual do sistema de som. Na capa e na parte interna do álbum, a reprodução da obra White Light de Jackson Pollock, ícone do expressionismo abstrato.

Com esse disco, Ornette Coleman sedimentou seu conceito da música livre e influencia músicos de todos os gêneros desde então. John Coltrane, Albert Ayler, Peter Brotzmann, The Stooges, Sonic Youth, dentre tantos outros, beberam direta ou indiretamente da libertação proposta pelo músico.

E é este homem que se apresenta neste final de semana (com ingressos esgotados) em São Paulo . Uma das últimas lendas vivas do jazz. Um músico de atitude que privilegiou sua busca interior sem pudores, sem se abalar com as críticas pesadas que vinham de todos os lados e que continua nos instigando com sua música autêntica e genuína, que nunca ficará datada. Músicos e público de todas as partes e estilos ainda hoje celebram e refletem acerca da obra deste arquiteto do jazz.

Como não poderia deixar de ser, Ornette Coleman vem com sua banda atual que tem uma formação pouco usual: dois contrabaixos, Tony Falanga no acústico e Albert Mac Dowell no elétrico e seu filho Denardo Coleman na bateria.

Um acontecimento imperdível para todos aqueles que apreciam se aventurar nos terrenos misteriosos e arrebatadores da música.

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